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Kaluanã é um nome masculino
de origem tupi-guarani considerado como significando “guerreiro” ou “grande
guerreiro”. Olhando de primeira, parece um nome feminino, principalmente se
considerado sem o acento final, sem o qual ele perde a semelhança com Cauã. Mas
é um nome completamente masculino, por incrível que pareça.
Kaluana ou Kaluanã é um
lutador de uma lenda da tribo kamaiurá. Os Kamaiurá ou camaiurá – são uma tribo
indígena tupi que vive na região dos formadores do Xingu, entre a lagoa Ipavu e
o rio Culuene (MT).
Kaluanã é um nome oriundo do tronco gramatical Tupi, da família
Tupi-guarani que significa “Grande Guerreiro” ou o “Grande Guarani”. Técnica,
garra, ausência de medo faziam com que os nobres Guaranis, ultrapassassem seus
limites, tonando-se assim o Kaluanã.
Compartilho aqui uma das lendas sobre o guerreiro Kaluanã:
‘’KALUANÃ
E IÇAIARA
Kaluanã era o filho do cacique e o melhor caçador
da sua tribo. Era silencioso e ágil, forte e inteligente. Conhecia todos os
ruídos dos animais da floresta, desde os gritos das aves coloridas até ao pisar
macio do jaguar, que anda roçando levemente o corpo na folhagem densa. Nem o
mais astucioso predador o surpreenderia sem aviso.
Kaluanã também conhecia o vento, e a forma como
este transporta e confunde os perfumes da selva, o seu odor e o odor da sua
presa. Sabia a que cheiram as plantas boas, as comestíveis e as medicinais, e
recuava diante da fragrância praticamente imperceptível das malignas, sem se
deixar iludir pelo seu viço.
Kaluanã tinha a visão de uma ave de rapina. Podia
seguir o voo de um pássaro na distância, ou encontrar um pequeno macaco nas copas
altas e cerradas, ou até perceber as tonalidades subtis que distinguem um inseto
da casca da árvore onde se camuflou. A sua seta era exata e mortífera.
Rodeado de tudo aquilo de que precisava, Kaluanã não conhecia a fome ou o temor
do futuro. Em cada novo dia, levava da floresta o alimento da sua família e
deixava na floresta o que lhe sobraria. Kaluanã
podia dizer com orgulho que era verdadeiramente um homem, um guerreiro sem medo
da morte e um caçador igual aos maiores que alguma vez cruzaram a densa mata. A
tribo admirava-o e os meninos sonhavam crescer como ele.
Mas Kaluanã
tinha um medo secreto, inconfessável, dilacerante.
Quando Kaluanã
nascera, o conselho de parentes e vizinhos reunidos para o nomear não conseguia
chegar a acordo. Convocado o transe do feiticeiro da tribo, a resposta dos
espíritos não se fez esperar: dentro do recém-nascido não existia uma, mas duas
almas gémeas, uma masculina e uma feminina. Horrorizado, o pai decidira
chamar-lhe Kaluanã, que significa o
Grande Guerreiro, e declarara que apenas uma alma, a do menino, podia viver no
seu filho. Da irmã gémea nada mais se diria, a não ser que o seu nome seria
Eçaiara, ou Aquela Que Foi Esquecida.
Apesar de proibida, a mãe de Kaluanã contara-lhe toda a história
quando ele atingira a idade adulta, e assim ele pudera finalmente conhecer o
nome daquela com quem dividia um só corpo. Porém, perdida a inocência da
infância, a vergonha do segredo que carregava passou a devorá-lo por dentro. Kaluanã temia que qualquer gesto seu,
um olhar, uma palavra, o pudesse trair, expondo a sua natureza feminina aos
olhos de todos. Esforçou-se por ser o mais forte, o mais rápido, o mais duro.
Era ríspido com a mulher, nunca brincava com os filhos e mantinha-se longe de
todas as tarefas femininas.
Mas na floresta, enquanto caçava sozinho,
sentia-a erguer-se dentro de si. Ela estava lá quando a brisa trazia os seus
aromas, e quando Kaluanã se
ajoelhava junto da presa caída por terra ela estava ao seu lado. Nas noites de
lua cheia ela crescia no seu interior, ocupando todo o espaço livre, fazendo
com que o coração lhe parecesse prestes a rebentar no peito e os olhos se
enchessem como as marés.
Incapaz de o suportar por mais tempo, Kaluanã procurou o feiticeiro da tribo
e suplicou-lhe que o livrasse de tão grande tormento, arrancando Eçaiara das
suas entranhas. Tal não era possível, disse o feiticeiro; Eçaiara apenas podia
ser adormecida, lançada num sono longo e profundo. O preço, no entanto, era
elevado. Kaluanã não hesitou, e
afirmou-se disposto a pagar a sua paz com tudo o que tinha. Então, o
feiticeiro, com o coração pesado, deu-lhe a beber a sua poção, que era doce,
aromática e inebriante como as flores venenosas da floresta, quando abrem as
pétalas coloridas e orvalhadas ao sol da manhã.
De início, Kaluanã não sentiu nada. Mas aos poucos, à medida que passavam os
dias, e depois as luas, e depois as estações, Kaluanã começou a compreender que estava finalmente sozinho quando
caçava na floresta ou quando adormecia na sua rede iluminada pela lua.
Sentiu-se forte como nunca, e soube então que era um guerreiro e um caçador
digno da sua estirpe.
Kaluanã aprendera as artes da emboscada e do arco
com o seu pai, e fora instruído no domínio dos artifícios da floresta pelos
melhores caçadores da tribo. Sabia encontrar e seguir a pista de qualquer homem
ou animal, e conhecia intimamente os hábitos das criaturas do mato. Por isso,
continuava a trazer abundante caça e pesca das suas incursões. Mas agora algo
havia mudado.
Os gritos dos animais não lhe soavam com a
mesma clareza, e os cheiros que o vento trazia chegavam-lhe ténues e
confundidos. As bagas venenosas pareciam ter perdido o brilho demasiado
evidente que até então fazia soar um alarme dentro de si, e por vezes as ervas
e os cogumelos mortais eram quase impossíveis de distinguir dos restantes. Os
sinais subtis de mudança do tempo chegavam-lhe mais tarde do que habitualmente.
A natureza parecia tornar-se cada vez mais opaca aos seus sentidos.
Lembrando-se bem das lições que recebera, Kaluanã
conseguia conservar o seu estatuto na tribo, mas tudo agora lhe parecia muito
mais árduo e cansativo. A floresta fechava-se devagar em torno de si.
Então, Kaluanã
passou a usar muito mais vezes a faca com que cortava o mato. Colocava
demasiado veneno na ponta das zagaias, e começou a caçar mais animais do que a
família podia comer num dia, porque crescia nele o medo de não conseguir uma
presa amanhã. Lentamente, a floresta surgia-lhe como inimiga, e Kaluanã só pensava em formas de a
vencer. Inventou redes e armadilhas, primeiro pequenas, depois capazes de
aprisionar vários animais de uma vez. Abriu as primeiras picadas que a selva
conhecera, e deitou abaixo árvores de cuja madeira não precisava, para rasgar
aquilo que agora lhe parecia ser um mato sombrio e impenetrável.
Na aldeia, só o velho feiticeiro assistiu às
mudanças com tristeza. As invenções de Kaluanã,
feito cacique da tribo, a sua impetuosidade e a novidade das suas estratégias
deslumbraram homens, mulheres e crianças. Em pouco tempo, toda a face da
floresta conhecida havia mudado. Ribeiros eram desviados para alimentar as
plantações das clareiras roubadas ao que antes era bosque frondoso; árvores
eram derrubadas para se fazerem acessos rápidos; animais eram caçados e
pescados em massa, porque era fácil fazê-lo. Toda a tribo esqueceu o que era
estar na floresta como um ser da floresta. Não é necessário conhecer aquilo que
se pode submeter pela força.
E Kaluanã
também esqueceu Eçaiara”
Fonte: Xamanismo.
Na lista da Arpen/SP (2015), há um
registro de Kaluanã, assim como um
de Kaluan e outro de Kalu, mas desse último, não faço ideia se é menino ou
menina.
Kaluanã não chega a ser um nome estranho, mas com certeza é bem exótico,
e tem algo nele de ambíguo, talvez um pouco de algo feminino que não consigo
precisar onde e por que me escapam. Talvez, por que, sem acento, ele daria um
nome feminino daqueles terminados em “ana” dos mais triviais (Kaluana = até
parecido com Luana). Curiosamente, exatamente como nos diz a lenda acima: um só corpo que compartilha uma alma feminina e outra alma masculina.
É um daqueles nomes indígenas que
não são conhecidos nem habituais, e exigem ousadia, personalidade e
excentricidade de quem vai escolhe-lo e depois, de quem vai usá-lo. Mas
considero uma excelente opção em termos de nomes indígenas masculinos.
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