quarta-feira, 12 de julho de 2017

Satan & Lúcifer

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Satan é um nome masculino frequente em círculos cristãos, porém, de uma forma negativa. Deriva do hebraico שָׂטָן (Satan), que significa “adversário” ou “hostil”. No Novo Testamento ele é também conhecido pelo título Diabo (Diabolos em grego). A tradução para o português deu em “Satanás” ou “Satã”, um termo originário da tradição e mitologia judaico-cristãs e geralmente aplicado à encarnação do Mal em religiões monoteístas.

Há registros, cronologicamente próximos, que a palavra Satanás, se origina diretamente da palavra Sátiro (do grego Σάτυρος — Sátyros) em cultura teológica grega. Talvez isso explica o uso de pés e chifres caprinos, como um bode, em um tronco humano, na maioria das representações medievais e até hodiernas do ser mitológico.

Portanto, Satan para a doutrina judaica-cristã é um demônio, uma divindade maligna, um opositor de Deus e de Jesus, e por aí vai. Mas é um nome, e para quem não é cristão ou é ateu, não significa absolutamente nada a não ser um nome como outro qualquer. Usar esse nome pode tanto ser interpretado como “muito cruel” por uma pessoa crente, como pode ser interpretado como um grande senso de humor por quem não crê.

Satan seria, para a mitologia hebraica, a personificação do antagonismo, muitas vezes sinónimo do Diabo (cuja palavra tem outra origem etimológica, como explicaremos nesse texto). Naturalmente, para quem não acredita nos preceitos judaico-cristãos, então não seria blasfêmia ou crueldade, realmente. Evidentemente, cristãos e judeus interpretariam como um nome horrível por conta de associar Satan à um mal iminente.

Além de Satan, Satanás, demônio, diabo, etc. um sinônimo ainda é Shaitan, um nome para Satan na mitologia árabe. Para mim, que não acredito, este é mais um personagem mitológico como Plutão, Hades, Zeus, Júpiter, Odin, Thor ou qualquer outro deus/demônio de mitologias por aí. A única diferença é que esse é da mitologia hebraica.

Sonoramente, o nome parece com Natan. Outro nome conhecido é Lúcifer, que é a tradução de uma palavra hebraica (heylel) e aparece apenas uma vez na Bíblia hebraica, em Isaías 14:12, que de acordo com a influência da tradução da Bíblia do Rei Jaime, significa “o brilhante, estrela da manhã” ou ainda, “portador da luz”. A bíblia na versão Septuaginta traduz para o grego como heōsphoros, que significa “o que traz o anoitecer”. Como você pode ver, ambos os nomes não estão nem remotamente relacionados e são utilizados para designar a mesma “deidade maligna”.

Aparentemente, um dos problemas mais terríveis da Bíblia são as traduções. Saindo do hebraico para ser traduzida para o latim, para o grego e depois para todas as línguas conhecidas, é evidente que muitos termos tornaram-se confusos. Uma delas é a confusão entre Satan (Satanás), diabo e Lúcifer.

Estudiosos da Bíblia como um todo – como fonte histórica, não com a perspectiva da religião – apontam que em termos mitológicos Satanás é um, e Lúcifer é bem outro. Lúcifer seria o “portador da luz” (do latim Lux Fero), Eósforos e Héspero, o Planeta Vênus em seus aspectos matutino e vespertino.

Já Diabo significa “acusador”, do grego “diabolos”, e pode se referir genericamente a qualquer pessoa que acusa e que se opõe à outra, não necessariamente uma entidade maligna. Já Satan (Satanás ou satã) significa “adversário”, “hostil”.

Outro termo que se aplica é «demônio» vem do grego δαιμόν (daimon), através do termo latino daemonium. Daimōn provavelmente veio do verbo grego daiesthai (dividir, distribuir). Os termos gregos não têm qualquer conotação de mal ou malevolência. De fato, εὐδαιμονία “eudaimonia”, (literalmente bom-espírito) significa felicidade. O termo adquiriu pela primeira vez suas conotações negativas na tradução Septuaginta da Bíblia hebraica para o grego, que se baseava na mitologia das antigas religiões semitas. O “daemon” helenístico acabou por incluir muitos deuses semitas e do Oriente Próximo como avaliados pelo cristianismo.

A Igreja Católica considera Lúcifer como sendo a mesma deidade que Satan, que seria um anjo que se rebelou contra Deus e foi expulso do Céu, apesar da Bíblia não ter sequer uma passagem que explicite isso. Naturalmente, diabo, demônio, Satan e Lúcifer são colocados na mesma panela, com uma infinidade de designações populares específicas da língua portuguesa como “capeta”, “capiroto”, “coisa ruim”, “inimigo”, “tentador”, “serpente”, “anjo mau”, “cornudo”, “maligno”, “chifrudo”, “malvado”, “tinhoso”, “cão” (sendo o cão um bichinho tão fofo, gente!), “tendeiro”, “príncipe das trevas”, “maldito”, “pai do mal”, “mafarrico”, “jurupari”, “canhoto” (olha o preconceito com as pessoas canhotas, gente!), “cão-tinhoso”, “anjo das trevas”, “belzebu”, “leviatã”, entre muitos outros.

A passagem usada para justificar a ideia de que Satan e Lúcifer são a mesma “pessoa”, é Isaías 14:12: "Como caíste do céu, ó Lúcifer, tu que ao ponto do dia parecias tão brilhante?". Trata-se de uma passagem controversa, uma vez que seria o desaparecimento da estrela Vênus diante da majestosidade do Sol, com alusão à crença de que o Império Babilônico desapareceria diante do poder de Yahweh (Javé ou Jeová, nome hebraico de Deus).

Como explica a Wikipédia:

Na tradução de Figueiredo verte Isaías 14:12: "Como caíste do céu, ó Lúcifer, tu que ao ponto do dia parecias tão brilhante?"
Lúcifer (do latim Lux fero, portador da Luz, em hebraico, heilel ben-shahar, הילל בן שחר; em grego na Septuaginta, heosphoros) significa "o que leva a luz", representando ao portador de luz, o planeta Vênus, que é visível antes do alvorecer. Provém duma raiz que significa "brilhar" (Jó 29:3), e aplicava-se a uma metáfora aplicada aos excessos de um "rei de Babilônia", não a uma entidade em si, como afirma o pesquisador iconográfico Luther Link, "Isaías não estava falando do Diabo.Usando imagens possivelmente retiradas de um antigo mito cananeu, Isaías referia-se aos excessos de um ambicioso rei babilônico."

A expressão hebraica (heilel ben-shahar) é traduzida como "o que brilha", nas versões NM, MC, So. A tradução "Lúcifer" (portador de luz), (Fi, BMD) deriva da Vulgata latina de São Jerónimo e isso explica a ocorrência desse termo em diversas versões da Bíblia.

Mas alguns argumentam que Lúcifer seja Satanás e por isso, também foi o nome dado ao anjo caído, da ordem dos Querubins (Ez 28.14). Assim, muitos nos dias de hoje, numa nova interpretação da palavra, o chamam de Diabo (caluniador, acusador), ou Satã (cuja origem é o hebraico Shai'tan, Adversário.

A religião judaica não possui um ser todo malévolo, que combata contra o Criador. Por outro lado, o nome hilel ben shachar (הילל בן שחר, filho d´alva), achado no livro do Profeta Isaías, a quem muitos atribuem ao Diabo, no contexto judaico relevo nenhum tem, pois se trata de uma referência ao rei da Babilônia, Nabucodonosor, que era daquela alcunha chamado. Atribui-se ao erro de interpretação, segundo a visão hebraica, a leitura da frase fora do contexto geral, pelo qual o profeta fazia uma exortação direta ao monarca.

A maioria dos cristãos, porém, considera a passagem como referente à queda física de um anjo, daí denominam Satanás como Lúcifer. A Bíblia, logicamente, nunca disse isso. Tanto que existe inclusive um São Lúcifer (Lúcifero), bispo da Sardenha, e embora sua santidade seja discutida, existe uma capela na Catedral de Caligliari é dedicada a São Lúcifer (talvez a única no mundo). Maria Josefina de Saboia, rainha consorte, esposa de Luís XVIII de França, está enterrada lá. Ele teve, inclusive, uma ordem de seguidores chamados Lúciferianos.

Seu nome demonstra que Lúcifer não era, pelo menos no século IV, apenas um sinônimo para Satã. Todavia, com os movimentos a partir do século XIX houve certa confusão, dando a entender que Lúciferianos (diferentemente do sentido teológico que é apresentado aqui) fossem Satanistas. É de se observar que isso não faz com que seu culto seja suprimido ou sua canonização reavaliada. Muito embora ele não seja muito citado para evitar mal-entendidos e escândalos.

Portanto, finalizando, Satan é o nome hebraico usado no Antigo Testamento para designar a entidade maligna, opositor de Deus, enfim, mas se você não crê, é um nome ou uma palavra como outra qualquer. Para usar esse nome, ou não tem nenhuma ligação religiosa ou tem muito senso de humor. É bom saber que, mesmo que você não acredite em nada disso, há milhões de pessoas que creem, e levar o nome Satan seria no mínimo embaraçoso ao longo da vida da criança. Por isso, é desaconselhável.

Lúcifer, comprovadamente, não se refere à demônio algum na Bíblia, sendo uma interpretação cristã errada baseada na leitura do versículo de Isaías fora de contexto. Ele se referia à Vênus, a estrela d’alva ou estrela da manhã, em última análise, ao rei da Babilônia, e não a um demônio em especifico. Logo, esse nome você pode usar numa boa, desde que esteja preparado para explicar o tempo todo sua decisão.

Repetindo, para mim que não tenho nenhuma ligação religiosa, Satan e Lúcifer são nomes como qualquer outro, retirados da mitologia hebraica. Lúcifer, nem isso, pois é um nome latino. Cabe a você repensar sobre isso, pesquisar e tirar suas próprias conclusões, baseadas nas suas concepções filosóficas e religiosas de vida. 





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Um comentário:

  1. Parabéns pelo texto e pelas ricas informações. É impressionante a quantidade de distorções que o Cristianismo fez para combater outras culturas, ter domínio social e mental sobre os povos e gerando até hoje, desinformação e intolerância.

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